Segundo dados de outubro/2019 do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), a contratação de empregados no setor da construção civil foi o que proporcionalmente mais cresceu no ano de 2019, registrando um aumento de 6,3% no número de empregados no setor[1], o que contribuiu para o crescimento de 1,9% na contribuição da construção civil para Produto Interno Bruto (PIB), no segundo trimestre de 2019, após vinte trimestres consecutivos de queda (em relação ao período anterior)[2], de modo que os dados indicam a retomada das obras de engenharia.
Porém, é imprescindível que as construtoras observem e evitem os erros cometidos pelas empresas do passado, lembrando-se que ainda recentemente foi deflagrado o maior escândalo de corrupção de nosso país, pela operação Lava-Jato, sendo que um de seus polos operacionais envolvia a atividade ilícita de grandes construtoras, que realizavam o pagamento de propinas em troca de benefícios econômicos. Curiosamente, uma das construtoras tinha um departamento específico para a administração e gerenciamento do pagamento de propinas, encobrindo as transações ilícitas e revestindo-as de aparente legalidade, praticamente um departamento de Compliance ao contrário.
Por claro, a Lei nº 12.846/2013, conhecida como Lei Anticorrupção, instituiu uma preocupação nas construtoras de investir em programas de ética e Compliance em suas empresas, de modo a evitar a responsabilidade objetiva de natureza civil e administrativa, por prática de atos contra a Administração Pública.
Assim, o valor de uma política de boas práticas é reafirmado pela legislação, sendo imprescindível a implementação de um programa de Compliance efetivo nas empresas de engenharia civil, para coibir a prática de ilícitos classificados como atos lesivos à Administração Pública, especialmente considerando que muito do mercado de construção civil é amparado em concessão de crédito por bancos públicos, obras de infraestrutura públicas e execução de obras imobiliárias de habitação popular (Minha Casa Minha Vida), sendo que a relação entre o ente privado e a Administração Pública é constante neste setor econômico.
É notório que o risco de a empresa de engenharia não ter um programa de compliance estruturado supera qualquer investimento feito na realização de boas práticas, não apenas em razão das sanções previstas na Lei nº 12.846/2013, mas principalmente danos reputacionais e financeiros que a empresa irá sofrer, por desconfiança do mercado, caso seja exposta a prática de algum ato lesivo à Administração Pública.
Porém, já é sabido que a mera implementação de um programa de Compliance não é suficiente, por si só, para garantir a licitude e transparência da atividade econômica desenvolvida, sendo que os mecanismos de integridade devem ser efetivos para o propósito almejado, de estimular uma cultura de ética na empresa. Por exemplo, uma das ferramentas disponíveis para efetividade do programa de integridade é o cumprimento dos critérios previstos pela ISO 37.001, que avaliam a exposição de risco da empresa no tocante ao oferecimento de pagamentos de subornos a terceiros.
Ainda, considerando que no ramo de construção civil é absolutamente comum que as construtoras, incorporadoras e empreiteiras atuem em parceria, mesmo sendo entidades independentes entre si, de modo que a prudência indica que elas realizem a análise de riscos e integridade (due diligence) para verificar a reputação da cadeia de relacionamentos das empresas parceiras, bem como de seus fornecedores, assegurando que todas as empresas envolvidas no desenvolvimento da obra estão de acordo com a política de integridade da empresa de engenharia.
Tampouco pode o empresário sentir que a necessidade de desenvolvimento de programa específico de integridade e ética é necessária apenas para as grandes construtoras, pois segundo cartilha publicada pelo SEBRAE em parceria com Controladoria-Geral da União, “grandes empresas multinacionais, cada vez mais, dão preferência para contratar empresas locais, inclusive pequenos negócios, que adotam medidas de integridade”[3].
Assim, podemos concluir que com o desenvolvimento de maturidade dos programas de integridade e ética, onde se estimula o hábito de empresas íntegras se relacionarem apenas com empresas íntegras, opera-se um poderoso efeito de rede, onde um crescente número de players recusam contratos e parcerias que não atendam o padrão mínimo de qualidade de compliance, de modo que toda empresa que atue no setor de engenharia civil e pretenda permanecer relevante no mercado terá que se adaptar a essa realidade.