A Pandemia COVID-19 aumentou a demanda por processos de trabalho informatizados, assim como a necessidade de maior eficiência orçamentária, situações que impactam diretamente a forma de atuar da Administração Pública, sobretudo no âmbito das contratações públicas.
Recentemente, o Tribunal de Contas da União – TCU publicou relatório de acompanhamento dos índices de governança e gestão dos órgãos e entidades da Administração Pública Federal, apresentando dados que compreendem o perfil integrado de governança e gestão de diversos setores.
De acordo com a Corte de Contas, o objetivo dessa avaliação é “identificar riscos sistêmicos; contribuir para o planejamento das ações de controle e induzir uma mudança de comportamento das organizações, estimulando a adoção de boas práticas de governança e de gestão”. Tudo isso, com fundamentos nos seis objetivos estratégicos do Plano Estratégico 2019-2025 do TCU, que são: “induzir o aprimoramento da governança do Centro de Governo, promovendo a maturidade da governança pública e a integração das políticas públicas federais; induzir o aperfeiçoamento da gestão de riscos e controles internos na administração pública federal; induzir a disponibilidade e a confiabilidade de informações na Administração Pública; induzir a profissionalização da gestão de pessoas do setor público; contribuir para melhorar a capacidade de contratação das organizações públicas; induzir o aperfeiçoamento dos mecanismos de governança multinível das políticas públicas a cargo da União, estados, Distrito Federal e municípios.”
Importante destacar que as boas práticas de governança esperadas, segundo a Corte de Contas, são aquelas relacionadas ao direcionamento, monitoramento, supervisão e avaliação de áreas; já as boas práticas de gestão, são aquelas responsáveis pelos processos organizacionais, que buscam maior efetividade e eficiência, elevando a satisfação da sociedade com os serviços públicos, quando possível, a um menor custo.
Assim, sem o intuito de comentar todos os índices indicados no relatório publicado pelo TCU, chama-se atenção aos seguintes, especialmente em razão da publicação da Nova Lei de Licitações e Contratações Públicas, Lei nº 14.133/2021, e os desafios que a acompanham: a) governança e gestão de Segurança e da Tecnologia da Informação; b) governança e gestão de contratações; e c) governança e gestão orçamentárias.
Em relação ao índice de governança e gestão de Segurança e da Tecnologia da Informação, os objetivos avaliados possuem relação direta com a ampliação do Governo Digital, universalizando serviços, tornando-os mais simples e efetivos, além de buscar o compartilhamento de dados de forma intragovernamental, sem, contudo, deixar de observar às diretrizes de garantia de segurança dos dados sigilosos e pessoais. O que se busca, portanto, é um alinhamento para que a governança esperada seja voltada “à efetiva entrega de benefícios às partes interessadas, com simultânea otimização de riscos e de recursos,” podendo ser realizada mediante a utilização de mecanismos de inovação digital. Esse, senão, é um dos objetivos expressamente previstos no artigo 11 da Nova Lei de Licitações e Contratações Públicas e que está, lado a lado, ao objetivo da busca pelo desenvolvimento nacional sustentável.
Dessa forma, de acordo com o Relatório em análise, houve melhora da capacidade geral de governança e gestão de Segurança e da Tecnologia da Informação, após um esforço das organizações envolvidas na análise em conjunto com o Tribunal de Contas da União, responsável pela fiscalização e fomento do tema.
Mas, há muito ainda para aprimorar.
Um dos pontos críticos da análise foi a constatação da baixa capacidade na gestão de pessoas, que se reproduz no relatório de, basicamente, todos os índices, especialmente em relação à escolha de gestores. Esse, sem dúvida, ainda é um dos maiores problemas da Administração Pública brasileira: agentes públicos não devidamente capacitados para as funções que lhe são atribuídas. Importante destacar que não se questiona a competência e técnica dos agentes públicos, mas, sim, que sejam, de fato, capacitados às funções que exercem. E essa, infelizmente, não é a realidade da máquina pública brasileira.
Outro ponto do relatório que chama atenção, desta vez de forma positiva, é o fato de que a gestão de riscos de tecnologia da informação foi uma das boas práticas que apresentou maior evolução e avanço, especialmente àquelas voltadas à adoção de métricas objetivas para mensuração de contratos de tecnologia e vinculação da remuneração ao resultado e desempenho do contratado.
Da mesma forma, em relação aos contratos em geral, um terceiro ponto de destaque no relatório foi a evolução e melhoria das práticas relacionadas à gestão de riscos nas três etapas da contratação, isto é: planejamento, seleção do fornecedor e gestão contratual.
E tal evolução nas contratações, especialmente em relação ao índice de governança e gestão de contratações analisado no relatório em comento, vai ao encontro das novas diretrizes da Nova Lei de Licitações e Contratações Públicas, Lei nº 14.133/2021, que possui uma preocupação muito grande com o tema da gestão de riscos, assim como com o planejamento das contratações.
Nesse sentido, importante destacar que a Lei nº 14.133/2021 foi expressa em relação às boas práticas de governança, tendo introduzido em seu artigo 11, parágrafo único, obrigação ao Poder Público para que implemente processos e estruturas de gestão de riscos e controles internos para avaliar, direcionar e monitorar os processos licitatórios e os respectivos contratos, promovendo, assim, um ambiente íntegro e confiável, bem como eficiência, efetividade e eficácia em suas contratações.
Além disso, o diploma em referência elevou a transparência ao patamar de princípio em seu artigo 5º e passou a exigir a implementação de programas de integridade em situações específicas, conforme disciplinam os artigos 25, §4º, 60, inciso IV, 156, §1º, inciso V e 163, parágrafo único, demonstrando seu compromisso com mecanismos de compliance, gestão de riscos e governança nas contratações.
Da mesma forma, a Lei nº 14.133/2021, demonstrando sua preocupação com o planejamento das contratações públicas, determinou de forma expressa o dever à Alta Administração de assegurar o alinhamento das contratações ao planejamento estratégico e às leis orçamentárias.
Esse dever, contudo, de acordo com o Relatório apresentado, tem-se apresentado como uma das maiores dificuldades das organizações analisadas, sendo que as deficiências mais significativas identificadas foram o alinhamento do orçamento ao planejamento estratégico, o estabelecimento de metas em prol de economia financeira e a identificação das reais prioridades no orçamento.
Assim, em um cenário de retomada, pós pandemia COVID-19, e de aplicação da Nova Lei de Licitações e Contratações Públicas, necessário é se incluir a dimensão da governança e gestão orçamentárias em todas as esferas da Administração Pública, de acordo com o Tribunal de Contas da União, com o propósito de incentivo à adoção de práticas voltadas ao “aperfeiçoamento do processo orçamentário organizacional e do estabelecimento das prioridades com vistas à consecução das metas organizacionais e à efetiva entrega de resultados à sociedade.”
Portanto, é preciso arrumar a casa o quanto antes, para que as contratações públicas realizadas em um cenário da Nova Lei de Licitações e Contratações Públicas, responsáveis pela consecução de inúmeras políticas públicas, e, por conseguinte, de entrega de resultados à sociedade, atinjam seus objetivos, notadamente, aperfeiçoando a gestão de riscos e controles internos, induzindo disponibilidade e confiabilidade de informações – reduzindo assimetria de informação –, melhorando a capacidade de contratação, e, por conseguinte, aperfeiçoando os mecanismos de governança e gestão da Administração Pública.
Fonte: ÍNDICES DE GOVERNANÇA E GESTÃO DE ÓRGÃOS E ENTIDADES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL DE 2021 (IGG2021). Relatório TCU. Disponível em: https://portal.tcu.gov.br/data/files/4B/62/5D/1B/8EBEB710C74E7EB7E18818A8/011.574-2021-6-BD%20-%20IGG2021.pdf.