Não há dúvidas de que o acordo de leniência é um mecanismo bastante importante a ser mais bem explorado no tocante ao combate e à fraude e à corrupção. Contudo, algumas ponderações precisam ser feitas, sob pena de tornar inócua a sua aplicação.
É que os acordos de leniência não geram efeitos em outras esferas, isto é, a leniência é válida apenas na esfera competente à celebração do acordo. A ausência de garantias na esfera penal aos administradores das empresas, por exemplo, pode ser crucial à celebração desses acordos. Da mesma forma em relação à reparação de danos na esfera civil, ou condenações administrativas por outros órgãos também competentes.
Naquilo que diz respeito aos benefícios, estes se resumem à isenção da obrigatoriedade de publicar a punição, isenção da proibição de receber do Governo Federal incentivos como subsídios e empréstimos, isenção ou atenuação da proibição de contratar com a Administração Pública e redução da multa em até dois terços. Veja-se que aqui há outro grave problema eis que o acordo de leniência, além de não prever a extinção da punibilidade, cria apenas um limite máximo de bônus em relação a multa, sem, contudo, garantir um benefício mínimo.
Em relação à leniência “plus”, conforme vimos na parte III desta análise, evidente que a forma como disposta no Decreto Federal nº 8.420/2015 traz insegurança jurídica, eis que não existem critérios objetivos a determinar o que seria uma circunstância relevante ou não, o que afastaria outras empresas de postular o acordo por consequência.
Diante dessas questões levantadas, torna-se absolutamente necessária a busca por leniências múltiplas – celebradas com mais de uma autoridade competente – e simultâneas a outras formas de cooperação, como com as colaborações premiadas e termos de ajustamento de conduta. Em outras palavras, considerando as lacunas existentes na Lei Anticorrupção, as leniências múltiplas e simultâneas conferem maior segurança jurídica à celebração de acordos.
Não se pode deixar, contudo, que algumas imperfeições da Lei impeçam a utilização desses instrumentos de suma importância em tempos de quebra de paradigma, eis que além de proporcionarem processos administrativos com maior densidade probatória, também incentivam e ampliam a cultura de prevenção e mitigação de riscos empresariais. E essa ampliação da cultura de integridade nas organizações, sejam elas públicas ou privadas, muitas vezes, materializa-se mediante a implementação de Programas de Compliance. Por isso, leniência e Compliance devem andar juntos de modo a assegurar um mal menor às empresas que cooperam com a Administração Pública, beneficiando, portanto, o Poder Público.