Ao analisar as regras sobre o tratamento de dados de crianças e adolescentes, que se encontram na Seção III da LGPD, retiramos que, como regra geral, o consentimento é a base legal necessária para o tratamento de seus dados, dessa maneira, o tratamento de dados das crianças ocorre apenas mediante o consentimento de um dos pais ou responsável legal. Entretanto, na aplicação prática, percebemos que a coleta deste consentimento não é tão simples e é necessário medidas específicas por parte de quem os coleta.
Suponhamos a seguinte situação: Uma criança irá participar de uma colônia de férias e o acampamento solicita aos pais que preencham um formulário de autorização, entretanto, para além da autorização em relação ao passeio, é solicitado também o consentimento para que sejam tratados os dados pessoais e a imagem da criança.
Comumente, é requisitado o consentimento para o tratamento das imagens de maneira contínua e ininterrupta, já que ocorrerá a divulgação publicitária em mídias sociais e sites. Ressalta-se, também, que raramente o direito de não consentir com o tratamento para finalidades diversas, como por exemplo o uso da imagem, é fornecido, e o direito de retirar o consentimento não é previsto.
Conforme previsão na LGPD, o consentimento precisa ser uma manifestação livre, inequívoca e informada. Entretanto, no caso apresentado o consentimento não pode ser tido como livre, porque a participação e autorização da ida da criança ao evento está vinculado à aceitação em relação ao tratamento dos dados, para as mais diversas finalidades, em consequência disso, podemos considerar ilegal o processamento dos dados pessoais das crianças.
No caso mencionado da utilização de imagens das crianças, o consentimento seria a única base legal para o tratamento de dados, sendo assim, caberia à escola coletar um termo de consentimento específico ou então permitir a opção de checkbox relacionado ao uso de imagem, ou qualquer outro uso de dados da criança que seja diferente da finalidade da realização do passeio.
Entretanto, conforme ressaltamos no início do artigo, o consentimento é a regra geral do tratamento de dados de crianças e adolescentes, havendo, portanto, as exceções. Sendo essas a possibilidade de processar os dados das crianças sem o consentimento dos pais quando necessário entrar em contato com seus pais, utilizados uma única vez e sem armazenamento, ou para protegê-los. Reconhecendo que os interesses da criança poderão não corresponder com à vontade dos pais ou tutores legais.
Conforme abordado, se percebe que as permissões para o tratamento de dados de crianças e adolescentes é bastante restrito, e aqui entendemos que cabe uma crítica no sentido de que outras bases legais poderiam ter sido consideradas pelo legislador, como por exemplo a tutela de saúde, o cumprimento de obrigações legais ou regulamentares e a garantia do exercício regular de direitos, sempre pautados, é claro, pelo maior interesse da criança, conforme previsto no artigo 14 da LGPD. Isso porque as escolas precisam processar dados de alunos para acompanharem o desenvolvimento das crianças e para cumprirem com obrigações perante o MEC e o Ministério da Educação, bem como os serviços de saúde têm a obrigação legal de notificar caso de doenças às autoridades sanitárias ou ainda casos de maus tratos às autoridades competentes.
O debate sobre o tratamento de dados de crianças e adolescentes é bastante complexo e merece nosso estudo, principalmente no sentido de evitar abusos, que ocorrem em maior frequência como os titulares de dados vulneráveis. Sendo assim, o tratamento de dados de crianças deve visar especialmente o seu melhor interesse.